Abra um caderno em branco
como quem abre um livro em busca de respostas. #travessia 8
No começo do mês de junho, um ciclone extratropical passou pelas bandas de cá. E isto me fez abrir um caderno em branco. Falo da região sudeste do Brasil. Para ser mais exata, da capital de São Paulo. O ciclone extratropical era fruto do antropoceno, a era geológica da Terra marcada pela interferência humana no clima.
Os dias que antecederam ao evento foram muito anunciados pela minha bolha de amigos e conhecidos. Tenho minhas dúvidas se as pessoas que seriam mais afetadas pelo evento ficaram sabendo sobre ele. Acho que não. Talvez tenham ouvido falar, mas já tinham outras dezenas de preocupações para pensar, como o trabalho extra para colocar comida nos pratos dos filhos.
Os que sabiam da notícia e que habitavam os territórios que seriam mais afetados e escolheram não negá-la se prepararam. Cuidaram das podas das árvores, compraram mantimentos para o final de semana e se organizaram para a possível falta de água e internet.
Surfistas se animaram com o evento que provocaria uma série de ondas. Surfistas-ambientalistas se dividiram entre a animação e a culpa por sentir animação. O ciclone traria estragos, mas também formaria ondas grandes e simétricas.
Aqui em casa, sinceramente, pouca coisa mudou. Eu sabia que dentro de um apartamento na capital paulista eu estava a salvo das chuvas e de estragos maiores. O vento forte da madrugada chegou a me acordar, mas o cansaço da semana me fez voltar a dormir rapidamente. Quem não permaneceu da mesma forma foi meu vaso de lavandas. Acordei e elas estavam mais bagunçadas do que meus pensamentos.
Mentira.
A verdade é que muita coisa mudou, sim. Eu voltei a dormir, mas tive sonhos intranquilos. Acordei observando as lavandas bagunçadas e pensei sobre as Donas Marias que não tiveram acesso às notícias e orientações de como cuidar dos seus, durante o acontecimento. Abri, rapidamente, um portal de notícias e me deparei com o fato: Algumas Marias estampavam manchetes tristes como resultado das chuvas e ventos desproporcionais da madrugada.
Foi na presença da angústia e da aflição que eu me sentei e abri um caderno em branco, como quem abre um livro em busca de respostas. Mas as páginas estavam em branco. Diante da falta de respostas prontas, comecei a escrever sobre aquelas lavandas emaranhadas e me indagar se era culpa do vento forte da madrugada ou se era falta de rega. As frases sobre as lavandas se desdobraram para outros caminhos. Eu nunca sei onde minha escrita vai me levar.
Mas o que quero dizer aqui é que abrir um caderno em branco fez com que eu não abrisse mais o portal de notícias, ou o aplicativo de fotos e vídeos, ou o aplicativo de encontro, ou uma aba de e-commerce. Abrir um caderno em branco me tirou do lugar de ser consumidora. Seja de conteúdo, de falso afeto ou de um produto qualquer.
Mas para além de me tirar do papel de consumidora, por algumas horas, abrir o tal caderno em branco me colocou no lugar de criadora. Mas criadora em um sentido da palavra que não estamos mais acostumados a usar. Criadora que rabisca frases e desenhos como quem busca fazer arte, e não conteúdo.
Que histórias aquelas lavandas emaranhadas estavam me contando? Quais histórias aquele breve momento de silêncio podia me trazer? O que as Donas Marias, que tiveram suas vidas drasticamente afetadas, gostariam de ouvir naquele momento? Como se chamaria a era seguinte ao antropoceno?
Uma página em branco pode conter uma espécie de magia. Naquele momento abriu-se uma fenda no tempo e no espaço e senti a respiração acalmar.
A palavra tem muita força.
Carola Saavedra, no livro “O mundo desdobrável- Ensaios para depois do fim”, comenta que para os povos Guarani, o mundo surgiu a partir da palavra. E que a palavra se desdobra. E, ao se desdobrar, pode criar diferentes significados, respostas, caminhos, mundos…
Mesmo que aquelas palavras não tenham chegado aos olhos dessas pessoas mais afetadas, ou nem mesmo aos olhos de outras pessoas, elas abriram um espaço interno para lidar com mais compaixão e presença diante daquele momento. Julia Cameron, autora de livros como “O Caminho do Artista”, diz que quando você escreve, você estimula ideias e através disso você pode olhar com mais clareza ao que está sentindo e o que deseja.
Então, o convite aqui é esse: deixar que as palavras se desdobrem, criem novas possibilidades, abram espaços internos e apontem caminhos ainda não percorridos. Que tal fechar algumas abas do computador e abrir um caderno em branco para começar a semana?
Depois me conta como tudo se desdobrou nos comentários?
“A escrita é também uma forma de conhecimento, de saber o que ainda não sabemos que sabemos. A escrita como um oráculo, como um sonho”. Carola Saavedra.
💠Conheça a di[versa] ideias em movimento
A marca di[versa] ideias em movimento tem o movimento no nome por trazer o desejo de criar experiências inspiradoras com o papel. Seja escrevendo, desenhando ou pintando, a marca preza pelo respeito ao próprio tempo de encontro consigo através do caderno.
A hashtag #escrevaseutempo nasceu para lembrar que temos nosso próprio tempo e podemos cultivá-lo de diversas maneiras, uma delas é em contato com papel e canetas e tintas e o que mais der na telha! O tempo que se constrói através do encontro com o caderno é escrito por cada pessoa.
💠O que pode a literatura, a arte, a escrita em um mundo em decomposição?
O podcast Página Cinco entrevista Carola Saavedra e busca possíveis respostas para esse questionamento:
💠Conheça o projeto Escritas Regenerativas
Escritas Regenerativas é tanto uma vivência de regeneração pessoal à partir da escrita, quanto um chamado à ação para enfrentar os desafios sociais e ecológicos através da construção de uma nova narrativa coletiva.
💠 Conheça o Artivista Orgânico Jhon Bermond
“É claro que o plástico vem da plasticidade. O que molda. A partir do jeito de um artista trazer sua obra ao mundo, por diferentes formas e técnicas. Mas eu quero algo diferente.
Não é uma técnica nova. Pelo contrário, é ancestral. Mas é diferente do comum.
O nome Artista Natural talvez seja o mais certo. E quero andar junto com uma galera que também queira isso.
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Muito bom
Muita gratidão por poder ler isso <3