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Transcender a Monocultura da Mente para driblar a agenda dos ecocidas
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Transcender a Monocultura da Mente para driblar a agenda dos ecocidas

Travessia #15: plantar

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Marina Dain
set 23, 2024
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Transcender a Monocultura da Mente para driblar a agenda dos ecocidas
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Passei 15 anos morando na roça, na zona rural de uma pequena cidade com 5 mil habitantes. Após a pandemia de Covid-19 — um período em que nosso ar estava poluído por um vírus invisível —, mudei para um município litorâneo de médio porte. Plantar em minha horta, viveiro, paisagem, está entre as coisas que mais sinto falta da minha vida anterior.

Quando cheguei nessa nova terra, morando em um pequeno lote urbano alugado, logo fiz alguns canteiros, mas uma infestação de caramujo gigante africano, que domina a região, devorou minhas pequenas mudinhas. Para piorar, além de ser uma praga que destrói plantios, esse caramujo pode causar doenças, tornando inseguro consumir plantas por onde ele passa. Catei centenas, mas essa é uma tarefa que precisa ser feita coletivamente — e meus vizinhos não estavam na mesma onda. Resultado: desisti e me mudei.

Na roça, na Serra da Mantiqueira, os vizinhos de lá estão sofrendo com as invasões do javaporco, que devoram plantações inteiras e destroem tudo por onde passam, inclusive nascentes.

Tanto o caramujo gigante africano quanto o javaporco foram introduzidos em nosso território por humanos que os trouxeram de outros países para vender por aqui. Mas os negócios não deram certo, e os bichos fugiram ou foram soltos em ambientes naturais, sem predadores, desequilibrando de forma preocupante os ecossistemas que ocupam.

Nas últimas semanas, 60% do território brasileiro está sob uma densa cortina de fumaça, resultado da prática criminosa de atear fogo. Incentivada pela crença de que essa é a melhor estratégia para abrir caminho para a boiada passar e o agronegócio se estabelecer.

E qual a relação entre o caramujo, o javaporco e o agronegócio?

Todos eles representam, perigo para o ambiente onde chegam. Nenhum deles é adequado ao nosso território. E só estão onde estão, e, principalmente, como estão, porque são frutos de visões de mundo que ignoram ou negam a complexidade sistêmica e a interconectividade de toda a teia da vida.

Vandana Shiva chama essa forma de pensar de “monocultura da mente”. Ela critica a imposição de uma visão única, reducionista e industrial, que destrói tanto a biodiversidade quanto o saber local. O agronegócio, assim como o caramujo e o javaporco, é um exemplo dessa visão de mundo que, ao impor a monocultura de alimentos, sufoca a diversidade de ecossistemas e comunidades.

Hoje, lidamos com o enorme desafio de transcender essa mentalidade dominadora, linear e extrativista, representada pela maioria dos nossos políticos, da direita, centro e esquerda, e por grande parte dos eleitores, de todos os segmentos.

A semente da consciência e responsabilidade ambiental ainda está circunscrita a uma minoria, que, entre todas as minorias, parece ser a menor. Enquanto cientistas nos pedem para olharmos para cima, para dentro, para a história e o futuro, os ecocidas impõem sua agenda de terror a milhares de indivíduos de todos os reinos e espécies.

Carlos Nobre, climatologista que há tempos faz alertas, disse recentemente:

“Estou apavorado! Ninguém previa isso, é muito rápido!”

Isso revela que as previsões eram otimistas, e a situação é mais grave do que imaginávamos.

Se, na pandemia de Covid-19, usávamos máscara contra algo invisível, agora, em diversas cidades, inclusive na mais rica do país, podemos ver a olhos nus a poluição de nosso recurso mais essencial, aquele do qual não podemos prescindir por mais de cinco minutos.

Na sabedoria da agricultura, olhamos para o ciclo da vida, morte e vida. Reconhecemos a importância da poda e conhecemos o tempo certo de adubar, semear e colher.

Hoje, vivemos a urgência de podar velhos paradigmas e semear saberes ancestrais aliados a novos. É tempo de, como diz Marcelo Gleiser, despertar o universo consciente. Para isso:

"A narrativa atual deve ser abandonada e substituída por outra, que celebre a raridade do nosso planeta e a exuberância da vida que abriga. Somos a única espécie animal capaz de nos aniquilar e, ao mesmo tempo, de compreender isso. Precisamos reorientar nossa relação com o planeta, fundamentada na gratidão. Somos a vida contando a própria história, e o próximo capítulo depende das decisões que tomarmos agora."

Vivemos um tempo decisivo. Nunca foi tão urgente plantar e implementar novas ideias e práticas. Precisamos espalhar sementes em todas as direções: em ações de contenção, na implementação de sistemas que sustentem a vida, e, principalmente, na mudança de consciência.

Um aspecto importante, é reconhecer que o Agronegócio tem força, poder e recursos para liderar esse movimento de transformação, poderiam escolher investir em tecnologias limpas, práticas agrícolas regenerativas e na recuperação de áreas degradadas. Investir em uma agricultura de baixo impacto ambiental, incluindo o apoio às comunidades e povos tradicionais locais. Isso tudo mantendo sua ‘competitividade global’, ao mesmo tempo que garantiriam ao Brasil uma posição de liderança global na preservação da biodiversidade, no bem estar social e no combate às mudanças climáticas. Então, uma missão que temos, é encontrar estratégias para sensibilizar essas pessoas a mudarem de consciência.

Mas enquanto isso não acontece, é bom lembrar que estamos às vésperas de eleições, e são poucas as candidaturas realmente engajadas com a causa ambiental. Os donos do poder permitem a aprovação de pacotes de veneno e a manutenção de nosso “colonialismo químico” (denunciado por Larissa Bombardi), derrubam leis de proteção ambiental e cedem ao lobby para abrir novas áreas para a exploração de petróleo. A mídia, ainda presa a interesses econômicos, noticia a catástrofe, mas evita apontar os responsáveis e sugerir soluções.

Sofremos todos... O país tropical, a "terra sem males", agora enfrenta tragédias para as quais não temos sabedoria nem protocolos para lidar.

O chamado é para que, independente de onde você estiver neste país, respire fundo (se puder), encontre seus aliados e aja nas três dimensões para promover a grande virada!

Não sabemos se ainda dá tempo, mas, se não tentarmos, se não entrarmos na onda da regeneração, a boiada vai passar, e vamos ficar a ver navios. 

Plantar a Virada: Contexto e Caminhos para um Futuro Regenerativo

Nos últimos anos, o Brasil tem enfrentado uma série de desafios econômicos e ambientais que colocam em risco não só o nosso presente, mas o futuro das próximas gerações. A seguir, alguns aspectos importantes, os impactos decorrentes deles, e sugestões de caminhos para uma mudança necessária.

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Uma publicação convidada por
Marina Dain
Marina Dain é Educadora, Palestrante, Mentora e Facilitadora de grupos. Designer e Pós-graduada em Psicologia, atua também com consultorias. Cofundadora de Terra Una e idealizadora do @ciclogaiaviva, coordena cursos do Gaia Education e vivências.
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