“Eu me contradigo? Pois muito bem, eu me contradigo. Sou amplo, contenho multidões”
-Whalt Whitman
Cada um de nós tem em si muitas contradições e incoerências. Somos múltiplos, diferentes e únicos ao mesmo tempo. Não somos “perfeitos” ou nem temos a capacidade de ser, pois isto cairia na própria incoerência da natureza humana. E como dizia Walt Whitman, contemos “multidões”, temos muitos dentro de nós mesmos. Nossas ideias mudam com o tempo e nenhum de nós é igual, pois justamente, cada um tem a sua única rede de relações que molda o que pensamos, o que fazemos, o que sentimos e como somos.
Sim, é possível que procuremos naturalmente ser coerentes aos nossos valores, propósitos e intenções, porque isso nos deixa confortáveis com nossas ações, nossas crenças e premissas mais enraizadas e nos aproxima da razão da nossa existência. No entanto, quando nos questionamos e refletimos sobre nossos próprios valores, somos capazes de ampliar os mesmos; quando nos permitimos sair de uma prisão da coerência enxergamos nosso avesso e, então, diluímos o peso da “perfeição”.
Incorporamos nossas contradições quando nos libertamos dos determinismos e das restrições morais da sociedade. Isso quer dizer que ter valores não tem sentido? Não. A partir deles é que temos a base para questionar, estar aberto a encontrar outras possibilidades - ou até mesmo confirmar a permanência de alguns. Por sorte, somos humanos, com erros, e principalmente com alto grau de aprendizagem.
O que nos pesa muitas vezes é a insegurança frente à incerteza. Aquela vontade de ter um fechamento, de saber o que vai acontecer, de ter definições claras que levam a uma padronização pré-moldada dos movimentos, que vem de uma homogeneização da Revolução Industrial e de um imaginário (do mundo corporativo dos anos 1980) da redução de risco.
Conquistar territórios de certezas pode nos dar uma sensação de segurança, mas esse comportamento limita nossa criatividade e principalmente a inovação. Ao encontrar algo desconhecido, somos surpreendidos, e podemos ver algo novo se criando (daí a inovação), do contrário ficamos estagnados e pouco construtivos para mudança.
Estar aberto ao que emerge (como propõe Otto Shcarmer em Leading from the Emerging Future) é o que permitirá romper com padrões passados ou facilitar o aparecimento de novidades. É deixar ir nossas convicções e dar atenção ao que emerge.
“Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo”
-Álvaro de Campos - Fernando Pessoa
O “vazio” permite conexões e a entrada de outra(o)s ou outras ideias, assim como no silêncio tem-se todo o potencial de som e no nada há o potencial para tudo.
Então, justamente nessas contradições é que podemos apreciar as possibilidades emergirem e se permitir esvaziar para abrir espaços. Nascemos com todo o potencial para fazer a mudança e aos poucos, no processo da socialização, nos formatamos aos padrões “mais aceitos socialmente”, os código de condutas do “normal” e uma linguagem comum.
E se tivéssemos um “modelo” de “não-modelo”, ou um modelo que inclui modelos?
Um modelo que fosse aberto para mudanças, de acordo com novas propostas e criado para permitir mais modelos. Geralmente, existe um apego muito grande em seguir modelos de governança, gestão, liderança, governo, educação e etc na crença de que possamos ter mais certezas do que fazer. E esses modelos são excelentes para determinar as etapas a serem realizadas sequencialmente e não deixar “vazios”. Não há nada de errado em ter métodos para construir processos, o problema está quando estamos mais preocupados em defender o modelo em si do que o próprio objetivo para que ele serve. Mas, imagina se pudéssemos ter um modelo que justamente está aberto (ou dá suporte) para que outros modelos sejam criados, deixando uma janela de oportunidades e diversidade constantemente aberta, desapegando da necessidade de seguir um único modelo.
A partir daí mora uma outra característica importante: aceitar. Quando aceitamos que algo diferente pode existir mesmo que seja contraditório àquilo que acreditamos, percebemos que não temos todas as respostas e que nem sempre seremos impecáveis. E que está tudo bem. É perceber que estamos coerentes quando nos permitimos mudar e flexionar nossas premissas que se parecem tão sólidas.
Por exemplo, criar meus filhos é um constante desapego do que eu acreditava que era “o melhor” para ela(e)s. Nem mesmo aquilo que sempre sonhamos em fazer na educação das crianças, uma série de expectativas, se tornam realidade. Muitas vezes o entorno dos nossos filha(o)s faz diferente, eles também pensam diferente de nós, têm outras redes próprias de influência, têm outros desejos e vontades, têm suas próprias percepções, suas próprias imperfeições… e mesmo assim, respirando na minha incoerência vou de encontro às minhas convicções.
Eu mesmo, que trabalho com sustentabilidade há mais de 15 anos, não consigo chegar perto de ser sustentável, não consigo comprar sempre produtos orgânicos por serem muito caros, não consigo me livrar dos plásticos e dirijo um carro à diesel regularmente. Mas um grande aprendizado foi não ter que carregar toda a culpa do mundo, largar algumas batalhas, escolher as lutas e não tentar resolver tudo; foi entender que nem sempre teremos o controle sobre tudo e que acolher nossas pequenas contradições não nos faz piores ou melhores. Apenas estamos vivendo.
Nesse contexto, por exemplo, há pouco tempo cruzei com a teoria da Inovação Social Transformativa (TSI) que por si já representa o processo de pesquisa combinado que evoluiu da convergência social das teorias de inovação social (apresentadas nas mais diversas vertentes e campos das ciências sociais) e mudança transformativa, “definida como o processo de desafiar, alterar ou substituir domínio de instituições existentes em um contexto social e material específico”.
Ou seja, a TSI vai além do foco tradicional em inovações tecnológicas e de produtos. Reconhece-se a inovação social como um fenômeno multinível, multiescalar e baseado na complexidade das relações. A TSI responde justamente a necessidade de olhar para iniciativas que acharam brechas nas estruturas sociais consolidadas, surpreenderam o status quo, emergiram com novas possibilidades e a partir daí foram capazes de transformar de fato aspectos da própria estrutura.
Agora imagina se as lideranças dessem mais espaço para inovações sociais que renovam as instituições, ou que as lideranças fossem na verdade mais facilitadores para iniciativas evoluírem do que sistemas de poder, controle e opressão?
Imagina se estivéssemos preparados para abraçar novas possibilidades e ter o poder de escolher o que nos faz mais sentido?
E imagina se esse “modelo” fosse o suporte para o surgimento de outro; e que fôssemos capazes de aceitar as diferenças e nossas incongruências e a da(o)s outra(o)s).
Conseguiu imaginar como seria esse mundo?
💠Falando em novos modelos de convivência… Vamos falar do Congresso FIC0O
"Mais compartilhar, menos competir. Mais relacionar uns com os outros e menos jogar contra. Mais ganhar junto e compartilhar experiências do que ficar só e na sua”. Este é o objetivo do FICOO – Festival Internacional da Cooperação.
A 5ª edição do Festival receberá entre os dias 12 e 14/10, em Brasília, mais de 400 participantes e pessoas convidadas. Daniel Wahl (Alemanha/Espanha), May East (Brasil/Escócia), Fábio Eon (Unesco), Helena Marujo (Portugal), Edgard Gouveia, Ita Gabert (Alemanha), Iara e Eduardo (Caçadores de Bons Exemplos), Wilson Nobre, Isabela Crema, Marcelo Castilho, Rodrigo D ́Almeida, Renata Nogueira, Marco Aurélio Bilibio, Magda e Felipe Vila, Roberto Martini e mais de 30 profissionais irão palestrar, dar oficinas, dialogar com o público, com o objetivo de motivar e instrumentalizar a prática da cooperação nas empresas, escolas, governos, comunidades, ongs e em todas as áreas da vida em sociedade. Para mais informações e inscrição acesse o site.
💠Positiv.a
A parceira da vez na nossa Comunidade Travessias é a Positiv.a . Uma empresa B, brasileira, ecologicamente e socialmente responsável. Fundada em 2016 com o compromisso de trazer alternativas aos produtos de limpeza e autocuidado convencionais, gerando impacto positivo para sua casa, para seu corpo e para o nosso planeta.
Na semana passada os membros da comunidade receberam os códigos para desconto por e-mail. Então se você faz parte da comunidade, cheque sua caixa de entrada 😉.
Se você ainda não faz parte, aproveite para se tornar membro e receber o desconto ainda esse mês. Além dessa vantagem, a comunidade é uma oportunidade para estabelecermos laços mais profundos com pessoas que estão pensando o processo de auto-aperfeiçoamento para além do próprio umbigo.
Bora?
Quer apoiar nosso trabalho e fazer parte de uma comunidade de trocas mais profundas?
Faça parte da Comunidade Travessias. Nela, além de receber os conteúdos abertos como esse e-mail, você também terá acesso a conteúdos, experiências e descontos exclusivos. Veja alguns bônus:
1 texto exclusivo por bimestre, escrito por uma pessoa convidada especial. Será o nosso Para Ler na Rede;
2 Mergulhos por bimestre - sugestões de práticas para aprofundamento dos temas da Travessia e fóruns de diálogos sobre o que cada pessoa vivenciou;
1 Encontro online com os membros da comunidade, a cada bimestre, para aprofundarmos nossas conexões e celebrarmos (na plataforma Zoom);
Acesso gratuito por 2 meses a 1 curso/vivência gravado por um dos colunistas;
Desconto de 35% em todo catálogo da Bambual Editora;
Desconto exclusivo em produtos e serviços com uma nova parceria comercial a cada bimestre.
Mude sua assinatura para a versão paga e faça parte da comunidade automaticamente:
Assinatura mensal: R$29,90
Assinatura anual: R$ 287,00