Desespero não ajuda em nada.
Repito essa frase mentalmente. Uma, duas, trezentas vezes. A cada vez que me deparo com mais uma imagem ou notícia sobre o desastre acontecido no Rio Grande do Sul. Continuo repetindo a cada vez que me lembro dos vídeos que vi. Meus olhos tem sido invadidos por imagens que eu nem quero descrever, na esperança vã de esquecê-las.
O céu já desabou faz tempo. Já vivemos uma espécie de filme distópico ou uma série de terror. Cair em uma espiral de desolamento, desespero, ansiedade e angústia é fácil.
Tenho raiva em lembrar que os cientistas têm nos avisado sobre as previsões catastróficas há pelo menos seis décadas. Tínhamos, pelo menos, 60 anos para mudar a rota. Em nome de um suposto "progresso", entre muitas aspas, os grandes líderes escolheram a narrativa de que os dados eram alarmistas demais. “Vamos seguir o bonde”, pensaram eles. E seguimos com a exploração sem limites dos "recursos naturais", também entre muitas aspas, ações que vem aumentando a temperatura do planeta, cada vez mais. A natureza, por sua vez, vem nos respondendo em busca de um equilíbrio. Apenas isso.
Tenho raiva de pensar nos inocentes, pagando com suas vidas, seus sonhos, seus amores. Nas histórias interrompidas ou adiadas. Tenho pânico em pensar no futuro. Nos meus descendentes. Nessas horas os planos a longo prazo se esfarelam.
O céu vem desabando e parece que não há nada mais a ser feito. Mas há.
Imersa na minha espiral de ansiedade e angústia, me deparei com a fala do Lucas Ghisleni elucidando que:
"se nos desesperamos, adicionamos mais um ser a esse oceano de dor e tristeza. O antídoto para o desespero é a ação".
Até o momento eu não tinha conseguido agir. Respirei e organizei as doações que eu poderia fazer no momento e as fiz com muita intenção.
Buscando um respiro e uma certa anestesia abri o álbum de fotos e vídeos dos registros da minha última semana. Estava no sul da Bahia, visitando amigas queridas e celebrando a união de um casal que transborda amor. Por lá, a chuva deu uma trégua e pudemos celebrar a vida e seus encontros. Me lembrei dos votos sobre um futuro e sorri. Entre os registros, vi a imagem da bandeira que reluz na sala das amigas que me receberam e que dizia "DEFENDER A ALEGRIA. ORGANIZAR A RAIVA." Sorri de novo.
Lembrei que meus olhos não foram invadidos apenas por imagens estarrecedoras.
Em meio ao caos, vi a raiva organizada. Vi o MST cozinhando para centenas de pessoas desabrigadas. Vi vizinhos resgatando crianças, animais e idosos. Vi mobilização de doações acontecendo em todos os estados, até em Lisboa. Vi o povo pressionando governo e empresas que comercializam água. Vi o povo arregaçando as mangas. Vi o povo organizando a raiva. Vi o povo agindo. Vi o povo.
Sim, o céu está desmoronando e há muito a ser feito. Somos capazes de uma mobilização para uma nova forma de viver. Um viver que revê conceitos de progresso, que prioriza florestas e que abre espaço para para atuações que colaboram para que todas as formas de vida se mantenham vivas. Eu sei que a gente pode. E o futuro é agora.
💠 ENCONTRO DE ACOLHIMENTO: Como transformar o desespero em ação.
Diante de tanta angustia, desespero e desolação, queremos resgatar as ferramentas do Trabalho que Reconecta (desenvolvidas por Joanna Macy) que nos ajudam a lidar com a dor do mundo e transformá-la em ações.
Por isso, nos juntamos a Bruna Buch, colunista da Travessias e Facilitadora do Trabalho que Reconecta para oferecer um encontro para as pessoas que estejam precisando elaborar seus sentimentos de raiva, dor, impotência, desesperança.
O encontro é gratuito e acontecerá online nessa sexta-feira (10.05) das 17h às 19h. Para participar basta acessar o link do zoom: https://us06web.zoom.us/j/82533066172#success